sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Museu de História Artificial


Um homem acorda, abre as portas do seu museu de História Artificial. Dirige-se ao quadro da luz. Acende mais de um bilião de lâmpadas com o sorriso. O museu ilumina-se. O homem ilumina-se. Reconhece o cenário da noite anterior. Por toda a sala, o seu quarto é projectado de uma forma muito vívida, mas sem muitos dos pormenores com que um olhar exterior poderia articular uma outra impressão. Para ter acesso a tudo, para obter a versão integral e em HD da sua noite anterior, sem as falhas a que normalmente está habituado que a sua memória o limite, este homem deveria ter dormido mais, bebido menos, e sobretudo não podia ter sucumbido tão cedo ao arrependimento, que o entregou imediatamente ao mais imerecido declínio.
Ao fundo da sala, uma cama alvoraçada, como as chamas quando o fogo é forte e egoísta. A curiosidade é o telescópio instantâneo da vontade e a inconveniência de olhar de si para si, do seu eu mais velho para o seu eu mais novo, traduziu-se numa aproximação lenta ao leito daquela morte pequenina. No segundo seguinte, vê-se a ele mesmo na cama com Romínika. A ondulação louca dos lençóis fez embaciar a objectiva. Uma pequena praia de nudistas é agora atingida pelo protagonismo de alguém que, do futuro, torna-se presente, extremamente presente, ao ponto de apontar a pistola aos dois e a decisão (também apontada, mas para si próprio) de se suicidar a seguir.

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