sábado, 13 de novembro de 2010

Da decepção




Subo até ao observatório da decepção. Lá em cima faz um vento tremendo. É a culpa e os cabelos da culpa a baterem-me no rosto e a deixarem consequências, uma música infértil que se aloja na violência da cena e não me deixa prosseguir com a observação.

Se estivesse à espera de ver florestas a arder, encontraria primeiro na tua pele os patrocínios, perto dos lábios da biblioteca e da história da humidade característica de certos livros, quando são folheados com um dedo, saliva e desdém.

Mas não.
Antes que as florestas ardam, antes que te veja com os olhos mergulhados no éter e na porcelana fina, eu estou atento à decepção e só à decepção.

Passo horas, por isso, entre o charme do alcance das vistas daqui sobre toda a península da distância contrita, com todas as suas montanhas nevadas de sémen seco, com todas as suas areias movediças, mesmo correndo o risco de te perder para sempre

nalguma praia projectada a mil quilómetros deste sítio, nua, completamente nua, apenas coberta de razão
e querosene

búzios, pólvora e pormenores.

4 comentários:

  1. André:
    Eu já disse o que tinha a dizer sobre a sua poesia.É certo que poderia enquadrar o discurso sob outros ângulos de visão crítica, mas o resultado conduziria sempre à mesma conclusão: Excelente e brilhante.

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  2. Este poema está escrito com tanta sensibilidade que até arrepia. Sinto ao ler que parece um acto de revolta ao quotidiano da vida e sem esperança que haja algo que nos faça despertar. Horas e horas, dias e dias a passarem sobre nós e onde está a verdadeira felicidade? Desilusões, amores desfeitos, paixões proibidas, miséria, guerra, corrupção e nós sem termos potência para fazer mudar o mundo.
    Penso que ao escreveres este poema não foi com este sentido, mas eu, ao ler, fiquei com uma certa angústia e não consigo pensar em mais nada. Lindo poema como a maior parte dos teus poemas. Já há muito que não escrevias um que me tocasse tanto. Obrigada amigo Poeta

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  3. Está muito fixe! Gostei

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  4. Nada mau , caro André! Só não gostei muito de "semen seco" e "musica infertil" mas tb não se pode pedir muito mais que isto! Parabéns

    João Cenáculo

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