sábado, 31 de março de 2012

Deuss disse



Deuss disse: dei-vos a possibilidade das lágrimas e vós persistis na recomendação do mutismo. Já não falais com chuva nos olhos, já para não falar nas palavras despidas. Nem o vosso olhar agradece o olhar do outro, como na primeira noite, onde tudo aconteceu e houve nuvens e nada ainda existia. A vossa noite atrai agora a idolatria (e só a idolatria), forma o hímen complacente daquilo que deserda o mistério por fé no equívoco e não protege ninguém.
A vossa noite não tem senão um corredor, muito íngreme e comprido, com portas regulares de ambos os lados, quartos com vista para todos os troféus, nenhum tão próximo, porém, da conveniência das janelas partidas. As vossas noites, outrora claras e cabalísticas, usufruem agora apenas do inesquecível como quem desenrola a vida em conserva e sente o cheiro oco da preservação do engenho, o corpo dietético do momento decisivo, o pequeno prazer de não estar vivo e continuar apesar da técnica do adeus. As vossas noites aborrecem-se lentamente na fórmula química do crime, como árvores que dessem frutos prejudiciais para aquele que não prova, mas observa.

1 comentário:

  1. Olá,

    Curioso,"fórmula química do crime... prejudiciais para aquele...(que) observa (!)",
    mas acho, quem prova dessa noite ou joga ou se ilude, vive? Fora de (bem) viver não ficará o prejudicial?

    Anabela Basinha

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