sexta-feira, 30 de abril de 2010

Do amor ufano e descortês




Não, nem mesmo inscrito em aulas de cavalaria
lendária, cursos de idealização à distância,
seminários sobre as últimas consequências
de estar vivo eu pude permanecer.

Os livros diziam que os teus olhos criavam um campo magnético
sinistro, e que depois matavam o macho que havia nos meus.

Todas as cartas de amor se revelaram de leitura difícil,
aplicada a prisão preventiva em todos os meus interesses.

Contei uma a uma as tardes de hipocrisia geral,
tardes de folclore, sorriso inacabado e detergente.
Meu deus: o que eu tentava permanecer
sem permanecer!

Agora chega.
As minhas mãos têm GPS integrado
mas tão longe das tuas estão
que não há satélite que as enuncie
na rua onde vives, na casa onde moras
no quarto onde dormes, talvez vestida de drama
de amor ufano e descortês.

Nem a espada, nem a bússola assintomática que comprei
nem o mapa do tesouro do teu corpo pixelizado no meu
no momento em que liguei a câmara e todas as luzes doeram
fizeram com que eu permanecesse
no ecrã e na tua relativa ucronia.

Quixote tinha razão: havia com certeza um vírus qualquer
na forma como os moinhos de vento agitavam as suas velas
sem se verem.
E claro: um rocinante de 1987, cheio de ferrugem,
dejectos de memória imprópria, cinzas e infiltrações
de todo o tipo, nunca fora muito favorável
às prosaicas esperanças das raparigas.

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